segunda-feira, 8 de junho de 2015

O Sono do Príncipe


 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)


Consta que a árvore do cacau for levada para a Ilha do Príncipe, como planta ornamental,  pelo Coronel José Ferreira Gomes. Como quase todas as culturas tropicais, o cacaueiro deu-se muito bem naquelas latitudes, e em pouco tempo tornou-se na riqueza do Príncipe. Como cultura extensiva que é, laboriosa e de trabalho constante ao longo do ano, é altamente exigente em de mão de obra. Para que exista mão de obra, é necessário que as condições de salubridade da ilha permitam a sobrevivência dos seus habitantes, coisa que não estava garantida, muito pelo contrário, quando o Príncipe é atingido por uma autentica doença alienante e mortal. Ou se abandonava a ilha ou se fazia frente à doença misteriosa.
Para dar um exemplo daquilo que era a mortandade, no ano de 1855 contavam-se 3.000 habitantes nativos, em 1907 restavam 350. Outro indicador aponta para que entre 1902 e 1913 tenham morrido 2.525 indivíduos, sendo que em 1902 eram cerca de 3.800 os habitantes.
Reza a história que por volta de 1825 começou a ser observada na ilha a “mosca do Gabão” (Glossina Palpalis). Nessa época havia um intenso comércio entre a Ilha e o continente Africano de gado e mercadoria, e também de transporte de escravos.


 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)

Até ao ano de 1870 eram raros os casos de “Hipnose”. No ano seguinte, em Lisboa, na Sociedade de Ciências Médicas, o famoso médico colonial Ferreira Ribeiro faz uma comunicação sobre este importante tema, sob o título “Moléstia de Diagnóstico obscuro”. A moléstia era já bem patente em várias regiões de Angola, mas não tanto no Príncipe. Porém, em 1877 dá-se um revés decisivo. Nesse ano entram na ilha numerosos trabalhadores vindos do Quanza e região do Cazengo onde a doença alastrava. O número de casos apresentou nesse ano tal incremento que passou a ser considerada “flagelo”. A taxa de mortalidade da tal moléstia era de 100%. A corroborar essa asserção é de referir que tendo a Roça Porto-Real contratado em 1894, 600 serviçais provenientes de Angola, região do Cazengo, passados 5 anos todos haviam perecido, vítimas da doença da hipnose que traziam incubada.  

 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)

A metrópole preocupada resolveu enviar uma missão científica. Assim em 1901, uma missão constituída por Aníbal Bettencourt que assumiu a chefia da mesma, por Ayres Kopke, Gomes Andrade e Correia Mendes, devendo-se acentuar ter sido esta expedição médica uma das primeiras missões científicas que demandaram o continente Africano e a primeira para o estudo da doença do sono. Entretanto a Royal Society of London apoiou duas missões britânicas de estudo da doença, em Entebe (Uganda).
A expedição esteve no Príncipe em Maio de 1901, tendo verificado que a Roça Sundy, com uma população aproximada de 400 serviçais baixavam diariamente ao hospital privativo, cerca de 10 doentes, em média, todos eles atingidos pela hipnose.  

(fonte: imagens disponíveis na internet)

O mundo científico dedica-se a investigar as origens e transmissão da doença. Surge a controvérsia entre a comunidade médica portuguesa e inglesa. Seria bactéria ou parasita?
Foi graças às descobertas de Manson , de Fonde e Dutton, que se identificou o vector da doença, a Glossina, e isolou o tripanossomas responsável pela doença. Com estes conhecimentos foi possível propor medidas de saneamento e combate.
Assim, numa segunda missão chefiada por Correia Mendes, que incluiu Damas Mora, Bruto da Costa e Silva Monteiro que permaneceu 1 ano no Príncipe, entre 1907-08, foram estudadas as condições para a propagação da doença e testados vários fármacos no seu combate, dentro os quais o Atoxil  que veio a ser o mais bem sucedido. Esta equipa propõe medidas de saneamento e combate à mosca e controle do depósito da doença.

Com trabalho e disciplina, em 1914 a doença encontrava-se erradicada. Bravo!

(fonte: "Comunicação apresentada ao I Congresso Nacional de Medicina Tropical, celebrado em Abril de 1952, Lisboa". )

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