sábado, 4 de julho de 2015

Enterrar os Machados (I)


Em 1759, um grupo de mercadores de Lisboa, do Porto e do Pernambuco  solicitam autorização à Coroa para estabelecer a “Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba”. Entre vários nomes encontramos Policarpo José Machado. 
Era ele filho de António Francisco Machado e de Valentina Franco da Mota, que terá nascido em Lisboa por volta de 1720. Casou em 1765 com Maria Luísa Albertoni, uma jovem que devia o seu "estranho" apelido a alguma costela italiana, sendo que a única pista da sua origem estrangeira” é a do avô materno Giovanni Francesco Jori, que aporteguesou o nome para João Jorge casado com Caterina Hebert. Consta que Giovanni nasceu e foi baptizado em Santa Maria da cidade de Horta (Novara, Milão).
A dita Companhia Geral do Pernambuco e Paraíba foi constituída com capitais próprios, sem participação da Fazenda real:
<Podia fabricar naus mercantis e de guerra nos estaleiros do Reino; cortar madeiras no distrito do Porto, em Alcácer do Sal e noutras matas, levantar gente de mar e de guerra para as guarnições a manter no Reino, nas Ilhas e nas capitais de Pernambuco e da Paraíba. Os seus navios só podiam ser recrutados para o serviço régio em caso de perigo na costa, barras e portos do Reino>.
Este Policarpo José Machado é nos anos de 1770 um abastado comerciante da praça de Lisboa, contratador geral de Tabaco. Em 1780 é também contratador das saboarias do Reino e Ultramar, juntamente com outros nomes como Anselmo José da Cruz, Luís Rodrigues Caldas e Geraldo Venceslau de Almeida Castelo Branco. A “licença” de exploração destas saboarias, por um período de 3 anos, custava 40 contos de réis pagos a fazenda real.

Terá sido destes conhecimentos e amizades dos negócios, que Policarpo José Machado casa o seu filho António Francisco Machado com a filha de Luís Rodrigues Caldas, D. Ana Maria Cleofa Pereira Caldas. Aliás, deve ter começado por aqui a longa tradição de casamentos entre primos.

(fonte ; geneall, páginas familiares)

Era D. Ana Maria Cleofa Pereira Caldas prima direita de Luís Pereira Velho Moscoso ( dos Pereiras Velhos de Moscoso, Senhores da Casa da Varjoeira junto a Monção), quem mandou edificar o palácio da Brejoeira, e que casou com a irmã de D. Ana Maria, a D. Luísa Maria Cleofa Pereia Caldas.

(Palácio da Brejoeira, fonte : Wikipédia)

<Cerca de 1806, Luís Pereira Velho de Moscoso deu início à construção do Palácio da Brejoeira, na freguesia de São Cipriano de Pinheiros. Com um custo total de 400.000.000 de réis, então um valor elevadíssimo, esta construção só foi possível por os antepassados do seu fundador terem conseguido no comércio uma grande fortuna. > 

Na geração seguinte, novamente uma série de casamentos entre os mesmos suspeitos. Parece ser clara a estratégia de manter na família, e se possível concentrar, o património. Policarpo José Machado, o neto, foi feito Visconde de Benagazil por D. Maria II em 1846, comerciante abastado de Lisboa, torna a casar com uma sua prima Pereira Caldas. O mesmo virá a suceder ao seu filho, também Policarpo José Machado (bisneto) que casa com uma prima, fruto também de uniões consanguíneas de apelidos Pereira Caldas Machado.
Parece pois não haver dúvida que a dispersão do património foi evitada e contrariada.

(Palácio do Caldas, fonte : CML)

Desta preocupação, ou casamento de Policarpo José Machado e D. Joana Francisca Rita Pereira Caldas Machado, nasceram 6 filhos, todos no Palácio do Caldas, que era pertença do avô materno António Pereira Caldas. Foram eles:
António Caldas Machado; Policarpo José Caldas Machado; Maria Assunção Caldas Machado; Joana Francisca Caldas Machado; Catarina Caldas Machado; Maria Madalena Caldas Machado.

Foram estes os últimos moradores do Palácio do Caldas, o do largo do mesmo nome ou melhor, actualmente Largo Adelino Amaro da Costa, Lisboa. Podia-se esperar encontrar a história destes irmãos, ou pelo menos do Palácio na net, mas curiosamente não há praticamente entradas para estes nomes. E porquê? Se por exemplo o aeroporto da Portela está implantado numa das suas quintas. Ou o Palácio dos Coruchéus em Lisboa também lhes pertencia. Não haverá um bloguista que ao tratar algum destes temas, tropece no nome deles? Será que estes irmãos não foram deliberadamente apagados, ou esquecidos com muito fervor?
(continua) 

terça-feira, 30 de junho de 2015

Pergunta o que não deve, ouve o que não quer.


(Rei D. Carlos, pintura a óleo Mário de Novaes)

A propósito de perguntas indiscretas e respostas habilidosas lembrei-me desta história. Parece aplicar-se à situação actual: à pergunta indecorosa, o troco é uma surpresa. Resultado, pouco resta senão sorrir e admirar a inteligência de quem parecia ser “indefesa presa”. Quanto à resposta dos gregos, logo veremos.

…episódio que se conta do nosso Rei, o Senhor Dom Carlos, que entrando no portão majestoso do palácio ducal de Vila Viçosa deparou com um jovem criado deveras parecido com os Príncipes, seus filhos. Muito intrigado, não resistiu a dirigir a palavra ao rapaz e, quase sem ele se aperceber do rodeio, inquiriu-lhe: - “Diz-me lá, moço, a tua mãe foi aqui empregada do Paço?”. O rapaz, muito cortês e respeitoso retorquiu-lhe com um sorriso um tanto malicioso: - “Saiba Vossa Majestade que não. Meu pai é que foi aqui jardineiro…”. O nosso Rei apreciou muito a resposta e só conteve a gargalhada porque havia aquele respeito a moderar as relações. 
de : R. Forjaz de Brito, 1984. 

domingo, 28 de junho de 2015

Era o Sal de Setúbal




Pelo interesse histórico que o sal teve na nossa civilização, e no caso em concreto, na actividade económica de Setúbal, aqui deixo apenas a descrição do que eram umas salinas na foz do rio Sado. Com pena minha, não consigo localizar exactamente as ditas salinas, mas talvez algum dos leitores possa vir a acrescentar informações que o venham a permitir. Apenas uma nota informativa, um moio corresponde a 900 kg.

(fonte: Do glorioso passado das marinhas do Sado; Neves, Renato) 

Aqui está uma avaliação das ditas salinas em 1868:

#1 Uma marinha nas Praias, freguesia de São Sebastião (da Palma, em Alcácer do Sal), desta cidade (Setúbal), que tinha na repartição na extinta roda do sal, noventa moios, da qual são enfiteutas os herdeiros de Agostinho Rodrigues Albino, e confronta pelo Norte com baldio de Santo Ovídio, pertencente a José Joaquim de Oliveira e Silva, do Sul com esteiro da citada marinha, Nascente com uma marinha de João José Soares, e Poente com a de D. Ana Carlota de Gomes Meneses Ferro, e atendendo ao seu estado lhe damos de valor a quantia de um conto e quinhentos mil réis.

#2 Uma marinha sita no Granadilho, dita freguesia, que tinha na extinta roda do sal, vinte e três moios, da qual são enfiteutas os ditos herdeiros, e confronta do Norte com esteiro da mesma marinha, do Sul com madre d’água, do nascente com marinha de José Maria do Patrocínio Meneses Ferro e do Poente com a de João Esteves de Carvalho, atendendo ao seu estado, damos-lhe de valor a quantia de trezentos mil réis.

#3 Uma marinha denominada a primeira, no sítio dos Montes, da dita freguesia, que tinha de repartição na extinta roda do sal, setenta e um moios, da qual são enfiteutas os ditos herdeiros de Agostinho Rodrigues Albino, e confronta do Norte com madre d’água da marinha do Guedes pequena abaixo confrontada do Sul e Poente com a dita madre d’agua e nascente com a marinha do Guedes, atendendo ao seu estado, damos-lhe de valor a quantia de setecentos mil reis.

#4 Finalmente uma outra marinha no dito sitio das Montes, denominada a segunda do Guedes pequena, que tinha de repartição na extinta roda do sal, cinquenta e três moios da qual são enfiteutas os ditos herdeiros, e confronta pelo Norte com a madre de agua e a marinha de José Maria da Costa, do Sul com a Madre de água, do Nascente com marinha do dito José Maria da Costa, no mesmo alagamento e poente com a marinha do Guedes grande, acima confrontadas e atendendo ao seu estado lhe damos de valor a quantia de seiscentos mil reis.

Setúbal, 12 de Novembro 1868.
…..
E duas outras Marinhas, situadas no esteiro da Palma, aforadas a Agostinho Rodrigues Albino, hoje a seus herdeiros:

#5 Uma marinha situada no esteiro da Palma, freguesia de S. João da Palma deste julgado (Setúbal), e ali depois de a termos examinado, vimos que confina do Norte com esteiro do Guedes, do Sul com marinha dos Carmos de João Infante de Lacerda, do nascente com marinha Fidalga de José Branco de Cabedo, e do Poente com marinha do Casarão de João Esteves de Carvalho. Calculamos que a referida marinha pelo seu estado e extensão, deve produzir, termo médio, nove centos moios de sal, que a preço médio de cada moio de novecentos reis, sendo portanto a importância total da produção de oito contos e dez mil reis. Que daquela quantia há a deduzir a quantia de trezentos mil reis, importância das despesas de custeamento, vindo portanto a ser o rendimento líquido da marinha quinhentos e dez mil reis, que tanto é o valor locativo dela, e avaliamos conseguintemente o valor venal da mesma marinha em dez contos e duzentos mil reis, importância de vinte rendas.

#5 Marinha denominada Guedes comprido, situada nos retro mencionados esteiro e freguesia, e ali observamos que esta confina do norte com a de João Esteves de Carvalho, de Sul com o rio da Palma e marinha dos Penentes, do nascentes com marinha do João Esteves de Carvalho, e do poente com rio da Palma. Calculamos em atenção à capacidade da mesma marinha que a sua produção media deve ser de trezentos moios de sal, que a novecentos reis cada um, importam em duzentos e setenta mil reis, que reduzidas as despesas de custeamento que calculamos em cem mil reis, vem a ser a renda líquida da marinha cento e setenta mil reis, e sendo este o valor locativo, segundo os cálculos que fizemos e deixamos referidos, é o valor venal da marinha de três contos e quatrocentos mil réis, importância de vinte rendas.


18 de Novembro 1868. 

sábado, 13 de junho de 2015

O Diplomata que vem de Alvito



( D. José Lobo da Silveira, décimo sexto Barão de Alvito, quarto Marquês de Alvito, 1928-1917). 

Consta que quando a Rainha D. Maria Pia lhe indagou se nascera em Alvito, D. José Lobo da Silveira respondeu, sempre no seu tom vivo e jovial, que lhe era característico: <Nasci em Belém, tal qual como o menino Jesus. Ali abri os olhos pela primeira vez a 11 de Março de 1826, um dia depois de ter morrido D. João VI no Paço da Bemposta. E acrescentava: morria um rei e logo nascia um camarista>.

Episódios protagonizados pelo Marquês de Alvito, pela sua piada, autenticidade e particular personalidade, chegaram alguns aos nossos dias. Mas de tantas vezes se fazer referência a este personagem como pessoa de particular “chiste”, e como só conheço "alguns" episódios, temo que tenham chegados muito poucos, do manancial criativo da "personagem". Com certeza, voltarei a D. José Lobo da Silveira mais vezes.

Era ele filho de uma família Miguelista, e que por isso amargou, perdendo não só património como influência. Por alguma razão, o décimo sexto Barão de Alvito e quarto Marquês de Alvito, foi acolhido por El-Rei D. Luís que o nomeou Gentil-Homem da sua Câmara Real.

Foi primeiro Barão de Alvito o Doutor João Fernandes da Silveira. Segundo alguns investigadores, era o Doutor João Fernandes da Silveira filho do Senhor Fernando Afonso da Silveira da casa dos “Silveiras” descendentes do grande “Giraldo sem Pavor”, aquele que tomou aos Mouros, no tempo D’El-Rei D. Afonso Henriques, a cidade de Évora, mas existem outras teorias.  O Doutor Fernando Afonso da Silveira, doutor em Leis por Bolonha foi Embaixador de D. João I, e quem negociou o casamento da Infanta D. Isabel com Filipe II de Borgonha e das pazes de 1411 com Castela.

Foi desta “esclarecida” casa dos Silveiras, que nasceu este João Fernandes da Silveira, doutor em leis, tal qual o seu pai o fora. Prestou muitos serviços à Coroa, foi Regedor da Casa da Suplicação de D. Afonso V, ao lado deste combateu no Norte de África e mais tarde está nas conquistas de Arzila e Tanger. Como diplomata integrou a embaixada de obediência ao Papa Nicolau V, tratou do casamento da Infanta D.Leonor com o Imperador Frederico III. O contrato deste casamento ainda se encontra em Nápoles e, curioso, no lugar onde a imperatriz D. Leonor, em 1452 se encontrou com o futuro marido, mandou o embaixador erguer uma coluna com o escudo de Portugal. Foi ainda feito cavaleiro pelo Imperador Frederico III.


casamento de D. Leonor de Portugal com o Imperador Frederico III

Mais tarde tratou do casamento da Infanta D. Joana com o Rei de Castela. Esteve em Roma como embaixador ao Papa Calisto III, e teve tantas outras missões a Roma, Veneza e Florença, tento prestado serviços não só a D. Afonso V, como também a D. João II que o “magnifico doutor” vê os seus esforços serem reconhecidos pela atribuição do título de Barão de Alvito, em 1475, o primeiro título de Barão dado em Portugal, para si e para a sua descendência.


(Brasão da Casa de Alvito é: em campo de prata cinco lobos pardos em aspa, armados de vermelho, tendo o escudo uma bordadura de azul com oito aspas de ouro: o timbre é um dos Lobos do escudo com uma aspa na espádua. Mais tarde foi acrescentada a bordadura de azul, que, em Portugal, é privativa dos barões de Alvito.)

A história deste doutor é longa e os 400 anos que medeiam o primeiro Barão do décimo sexto dão “pano para mangas”. Prometo continuar mais amiúde. 


segunda-feira, 8 de junho de 2015

O Sono do Príncipe


 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)


Consta que a árvore do cacau for levada para a Ilha do Príncipe, como planta ornamental,  pelo Coronel José Ferreira Gomes. Como quase todas as culturas tropicais, o cacaueiro deu-se muito bem naquelas latitudes, e em pouco tempo tornou-se na riqueza do Príncipe. Como cultura extensiva que é, laboriosa e de trabalho constante ao longo do ano, é altamente exigente em de mão de obra. Para que exista mão de obra, é necessário que as condições de salubridade da ilha permitam a sobrevivência dos seus habitantes, coisa que não estava garantida, muito pelo contrário, quando o Príncipe é atingido por uma autentica doença alienante e mortal. Ou se abandonava a ilha ou se fazia frente à doença misteriosa.
Para dar um exemplo daquilo que era a mortandade, no ano de 1855 contavam-se 3.000 habitantes nativos, em 1907 restavam 350. Outro indicador aponta para que entre 1902 e 1913 tenham morrido 2.525 indivíduos, sendo que em 1902 eram cerca de 3.800 os habitantes.
Reza a história que por volta de 1825 começou a ser observada na ilha a “mosca do Gabão” (Glossina Palpalis). Nessa época havia um intenso comércio entre a Ilha e o continente Africano de gado e mercadoria, e também de transporte de escravos.


 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)

Até ao ano de 1870 eram raros os casos de “Hipnose”. No ano seguinte, em Lisboa, na Sociedade de Ciências Médicas, o famoso médico colonial Ferreira Ribeiro faz uma comunicação sobre este importante tema, sob o título “Moléstia de Diagnóstico obscuro”. A moléstia era já bem patente em várias regiões de Angola, mas não tanto no Príncipe. Porém, em 1877 dá-se um revés decisivo. Nesse ano entram na ilha numerosos trabalhadores vindos do Quanza e região do Cazengo onde a doença alastrava. O número de casos apresentou nesse ano tal incremento que passou a ser considerada “flagelo”. A taxa de mortalidade da tal moléstia era de 100%. A corroborar essa asserção é de referir que tendo a Roça Porto-Real contratado em 1894, 600 serviçais provenientes de Angola, região do Cazengo, passados 5 anos todos haviam perecido, vítimas da doença da hipnose que traziam incubada.  

 (fonte: Instituto de Investigação Cientifica Tropical)

A metrópole preocupada resolveu enviar uma missão científica. Assim em 1901, uma missão constituída por Aníbal Bettencourt que assumiu a chefia da mesma, por Ayres Kopke, Gomes Andrade e Correia Mendes, devendo-se acentuar ter sido esta expedição médica uma das primeiras missões científicas que demandaram o continente Africano e a primeira para o estudo da doença do sono. Entretanto a Royal Society of London apoiou duas missões britânicas de estudo da doença, em Entebe (Uganda).
A expedição esteve no Príncipe em Maio de 1901, tendo verificado que a Roça Sundy, com uma população aproximada de 400 serviçais baixavam diariamente ao hospital privativo, cerca de 10 doentes, em média, todos eles atingidos pela hipnose.  

(fonte: imagens disponíveis na internet)

O mundo científico dedica-se a investigar as origens e transmissão da doença. Surge a controvérsia entre a comunidade médica portuguesa e inglesa. Seria bactéria ou parasita?
Foi graças às descobertas de Manson , de Fonde e Dutton, que se identificou o vector da doença, a Glossina, e isolou o tripanossomas responsável pela doença. Com estes conhecimentos foi possível propor medidas de saneamento e combate.
Assim, numa segunda missão chefiada por Correia Mendes, que incluiu Damas Mora, Bruto da Costa e Silva Monteiro que permaneceu 1 ano no Príncipe, entre 1907-08, foram estudadas as condições para a propagação da doença e testados vários fármacos no seu combate, dentro os quais o Atoxil  que veio a ser o mais bem sucedido. Esta equipa propõe medidas de saneamento e combate à mosca e controle do depósito da doença.

Com trabalho e disciplina, em 1914 a doença encontrava-se erradicada. Bravo!

(fonte: "Comunicação apresentada ao I Congresso Nacional de Medicina Tropical, celebrado em Abril de 1952, Lisboa". )

domingo, 31 de maio de 2015

Mais rápido que o Gatilho de Junot.


(Embarque da Família Real, Belém, 1807, fonte: Wikipédia)

É sabido que a Família Real se retirou em 1807 a quando das terceiras invasões francesas. Sabemos também que o Rio de Janeiro foi Capital de Portugal, bem como algumas aventuras pelas terras do Brasil. O que não fazia ideia era como o plano de retirada tinha sido pensado e quanto tempo tinha levado para o delinear e executar. Aqui fica um relato da extraordinária "epopeia"da transferência da corte para o Brasil.

No dia 25 de Novembro de 1807, por volta da meia-noite, à porta do Visconde de Rio Seco bateu um mensageiro D’El Rei D. João VI requisitando a sua presença imediata no Palácio da Ajuda. Sem se demorar nem um minuto, logo partiu para a Ajuda. Esperava-o Frei Custódio de Campos, logo ali nos claustros do Palácio. <- Bem-haja por acorrer tão depressa aos pedidos D’El Rei. Aguarde! > disse.  O Visconde, D. José Joaquim d’Azevedo, segurou nas mãos o pomposo chapéu, nervoso inspecionou as abas, os adereços, sacudiu a chuva , entretia as mãos e largava dos pensamentos, rápidos, vagos. O que seria? Porque razão o tinham chamado?


(Retrato Visconde de Rio Seco, Palácio Nacional da Ajuda). 

De política, pouco sabia o Visconde, já em contas era especialista. Em 1807 estava o Reino de Portugal num estado deplorável, os cofres vazios, muito fruto das somas imensas que o Governo Português tinha pago a Bonaparte, na tentativa de manter a neutralidade.  Esgotadas todas as iniciativas diplomáticas, tendo já lançado mão de todas as missões possíveis que se mostraram infrutíferas, pedidos todos os sacrifícios e feitas até propostas desfavoráveis ao decoro nacional, reuniu-se mais uma vez o Conselho de Estado. Tinha-se sabido naqueles dias que o exército inimigo tinha entrado em três pontos do território Português. A situação era dramática, sem tempo para lançar mãos às armas, até porque não havia orçamento, com Junot a entrar por Abrantes, Carasa ia para o Porto e Solano para o Alentejo e Algarves, o que fazer? Abandonar o Rei às mãos do inimigo? Aproveitar uma esquadra aportada em Belém e fazer desaguar a Capital de Portugal, o Rei e o Reino pelas águas do Tejo, rumo ao Brasil?


(Família Real Portuguesa, fonte : página da internet "História do Brasil")

<- Vossa Excelência pode acompanhar-me.> , seguiram em passo rápido para a sala onde estava reunido o Conselho de Estado. Ali, e de viva voz, foi Sua Majestade que lhe deu instruções sobre o embarque que devia acontecer impreterivelmente na tarde de 27 de Novembro, i, é, daí a menos de 48 horas.
Logo começou a azáfama. O Ex.mo Marquês de Vagos, Gentil Homem da Câmara, convocou o  Ex.mo Conde de Redondo, Vedor da Ucharia (despensa da casa real) , e Manuel da Cunha, Almirante da Esquadra, para conjuntamente organizarem os remessas necessárias das suas repartições, enquanto o Visconde de Rio Seco apressou-se ao Palácio das Necessidades para ali verificar  o que devia ser embarcado. Havia ainda que combinar com o Padre José Eloi que pertences da Santa Igreja Patriarcal poderiam ser transportados. Uma grande operação de logística, delegada a cada um dos chefes da própria repartição. Quando ao Visconde, este assentou barraca em Belém de onde viria a coordenar o dito embarque real.  


(Embarque da Família Real, Belém, Lisboa, fonte: Wikipédia.)


No dia 27 de Novembro, pelas 8 horas da noite, chegou ao cais Sua Majestade e sua família que logo embarcam. Por seu turno, o Visconde de Rio Seco, depois de mais umas peripécias acaba por conseguir também embarcar com a sua família rumo ao Rio de Janeiro. Assim foi. No dia 28 o tempo não estava de feição, no dia 29, com o vento a soprar de nordeste El Rei manda levantar âncora, com Junot às portas de Lisboa, a esquadra deixa as costas de Portugal. No dia 30, pelas 9 da manhã, Junot entra em Lisboa com o seu exército de cerca de 26.000 homens. A esquadra viria a desembarcar em Salvador da Bahia no ano seguinte, a 24 de Janeiro de 1908. 


(fonte: Postais de Portugal, internet)

Fontes: Exposição Analítica, e Justificativa da conduta e vida pública, do Visconde de Rio Seco, Rio de Janeiro, 1821). Wikipédia.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

von Oriola, e as voltas que o mundo dá.


Há poucos dias apareceu, finalmente, alguma informação sobre D. Joaquim José Lobo da Silveira, na página da Wikipedia Alemã. Digo finalmente em alemão, pois o sétimo conde de Oriola, em duas vidas, naturalizou-se Prussiano em 1822. Em Portugal, filho do 20 Marquês  e 120 Barão de Alvito, 60 Conde de Oriola, e de D. Bárbara de Meneses foi Gentil-Homem da Camara Del-Rei D. João VI, Provedor da Casa da Índia, Comendador da Ordem de Cristo, Enviado extraordinário Plenipotenciário junto da corte de Estocolmo, Enviado de Portugal aos Congressos de Viena de 1814 e Berlim, Embaixador extraordinário de Portugal em Paris.

(D. Joaquim Lobo da Silveira, 7 conde de Oriola, Graf von Oriola) 

Não me é clara a razão pela qual se torna Prussiano, nem porque razão ali lhe foi concedido o titulo de Conde von Oriola (Graf von Oriola) para si e para os seus descendentes. Na Prússia foi conselheiro de Sua Majestade o Rei da Prússia, Membro do Estado da Nobreza na Assembleia da Província da Lusácia onde comprou terras, Grã Cruz da Águia Vermelha da Prússia. Parece ser evidente que o Kaiser tinha por ele grande estima, e não consta que tenha sido pelo casamento que fez com Sofie Amelie Murray, na Suécia, filha do professor da Universidade de Gottingen Johan Andreas Murray, que venha alguma relação especial com o Kaiser, pois não encontro em Sofie alguma relação que o justifique.  Os motivos para tal tratamento da parte do Kaiser perderam-se no tempo, e agora já não há disso memória. O que consta é que em Portugal a notícia da sua naturalização não foi bem recebida. Diz-se que foi D. Miguel I, mas já ouvi que foi D. Maria quem lhe retirou a nacionalidade por “não ter as qualidades de um português”.  

Visto assim, à distância, diríamos que D. Joaquim, agora Graf von Oriola teria sido banido e ostracizado do Reino de Portugal, para nunca mais regressar. A história mostra o contrário. D. Joaquim Lobo da Silveira, Graf von Oriola tem várias filhas e dois filhos, um, Eduardo será General o outro, Deodato será Embaixador. É nas linhas descendentes destes que tornamos a vê-los regressar timidamente a Portugal. Ia jurar que todos falavam Português, pois um dos descendentes de Joaquim, nascido em 1895, seu bisneto vem a Portugal em 1960 e fala Português. Traz ainda a filha jovem, também versada na nossa língua. Ao fim de várias gerações, os laços emocionais continuam a ser alimentados, a memória prevalece.


(D. Eduardo Lobo da Silveira, Graf von Oriola; fonte: Olga Majeau) 

O mundo tão grande, e o tempo tanto o que já passou, é extraordinariamente organizado , colocando-nos ciclicamente nos mesmos percursos. Nesses caminhos, encontramos os outros ‘penitentes”, trazem perguntas que são as nossas respostas. Nem mais, duzentos e tal anos depois da saída de Portugal de D. Joaquim Lobo da Silveira, encontro uma sua neta à procura de respostas sobre a vida do seu bisavô Árpád Eperjesy de Szászváros et Toti, bisneto de D. Joaquim, Graf von Oriola. Árpád é filho de D. Armgard Lobo da Silveira, Gräfin von Oriola e de Albert Szaszvarosi Eperjesy, Diplomata ao serviço do Império Austro-Húngaro. Não causa surpresa o facto do Embaixador Albert Szaszvarosi Eperjesy tenha tido uma missão de 3 anos em Lisboa, entre 1902 e 1905.


(D. Armgard Lobo da Silveira, Gräfin von Oriola com o seu filho Árpád; fonte: Olga Majeau) 


Árpád Eperjesy de Szászváros et Toti nasceu em Roma, em 1882 e apesar de ter vivido até 1972, a sua vida e identidade era um mistério para a sal bisneta Olga. Na família, Elfi, avô de Olga e filha de Árpád contava as histórias dos seus avoengos, mas não de Árpád. E porque não?  Foram umas dezenas de cartas antigas, um anel e alguns retratos que aguçaram a curiosidade da bisneta que se lançou à descoberta. Soube que Árpád tinha sido deportado para um Gulag, nos anos 40, quando se encontrava em Budapeste.  Porquê? O que guarda este “personagem” só lendo o livro da sua bisneta, Olga Majeau.


quinta-feira, 14 de maio de 2015

A cobiça do Açúcar

(fonte: retirado da internet) 

António Rodrigues Pacheco, filho de Gaspar Pacheco e de D.Catarina Henriques Sena , casado com D. Catarina de Latá herda de seu pai Gaspar um Morgado na Brasil, Pernambuco.
António Rodrigues Pacheco morre em 1664, Lisboa, deixando dois filhos: D. Paula Pacheco e João Pacheco de Sousa (nasce em Lisboa em 1635).  Será, ou pelo menos admite-se que seria o seu filho varão quem o sucederia em todos os seus bens.
Terá sido entre a administração de António Rodrigues Pacheco e o seu filho João Pacheco de Sousa que o Pernambuco sofreu as invasões dos Holandeses, e que o engenho de Goiana Grande, de invocação a São Filipe e Santiago foi confiscado e posteriormente vendido a um tal Hans Willem Louisen, que além deste engenho “comprou” ainda outros no Pernambuco.
No entanto, em 1645 dá-se a “Insurreição Pernambucana” levando à expulsão dos Holandeses do Brasil.  Possivelmente terá havido algum processo de entrega das propriedades confiscadas aos antigos donos, pois em 1742, um neto dos anteriores, também de nome João Pacheco de Sousa deixa em testamento 1/3 do referido Morgado : “Por cinco contos, trezentos e trinta e três reis, caberá a ele por terça dos dezasseis contos de reis, em que foi estimado o engenho de açúcar com todas as suas pertenças e currais e fabrica, que está na capitania de Itamaracá, Goiania….> .

Em 1780, António Xavier Pacheco de Sousa, filho deste João Pacheco de Sousa e de D. Ana Josefa de Almeida Silva e Vilhena, sucessor em todos os vínculos de seu pai, toma “posse” da propriedade.

A partir desta data perde-se o rasto do Morgado. 

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Alfarrobeira

(fonte: blog Vila Espanca)


Também me acontece. Sempre que escolho uma fila para pagar, fico na pior. Se apoio uma lista, ganha a outra. Quando foi para escolher entre VHS ou Betamax, escolhemos Betamax. Se é para estar com D. Pedro, estamos com D. Miguel, quando se devia ser Republicano então somos Monárquicos. Se a opinião geral é assim, pois claro, estou no assado.
Foi o que aconteceu a João de Lisboa, secretário e escrivão da Câmara do Infante D.Pedro. Consta que o Infante regente lhe concedeu vários privilégios e bens, como uma casa na Mouraria que tinha pertencido a um mouro de nome Fornachos.  Tudo corria bem na vida de João de Lisboa, quando não é que na corte surge uma tramoia urdida por meia dúzia.
Quando a intriga se enquista na casa de D. Afonso V, o Rei dispensa os serviços do seu tio outrora regente, o Infante D. Pedro. Consta que o Duque de Bragança, o conde de Ourém e o arcebispo de Lisboa estavam à cabeça desta maquinação contra D. Pedro, pois este era defensor da centralização régia do poder, enquanto os conspiradores pretendiam manter a sua influência nos destinos de Portugal. O Infante retira-se para Coimbra, os seus apoiantes são perseguidos. Ainda antes do confronto, João de Lisboa vê os seus bens serem confiscados. Participa na Batalha de Alfarrobeira , 1449, no lado de D. Pedro, perdedor.
Todavia, é perdoado pouco depois de um ano após a batalha, é conduzido para o cargo de notário do reino, escrivão régio. É nesta altura que surge como administrador do Morgado da Granja, Almada. Há quem diga que <…Álvaro Guedes casado com Maria de Lisboa, filha única que foi do senhor secretário de estado João de Lisboa, a quem El Rei D. Afonso V fez mercê deste Morgado (da Granja)…>, mas há referências que apontam para que tenha sido D. Maria Pires Romão quem lhe deixou o Morgado da Granja. 1  
Resolvido o enigma de quem era João de Lisboa, agora há que descobrir quem era D. Maria Pires de Romão.

1.       Moreno, Humberto Baquero. A Batalha de Alfarrobeira. Antecedentes e Significado Histórico. Vol. II.  Biblioteca Geral da Universidade.  Coimbra 1980. 

sábado, 2 de maio de 2015

Mata Quatro


(fonte: Cartografia Digital da Direcção Geral do Cadastro) 

O nome parece um cabeçalho de um qualquer jornal sensacionalista, e quem sabe, algures na história algum herói matou quatro, por isso a homenagem, mas sobre isso não tenho informação. Certeza é que se trata de um lugar, uma terra que fica em Almoster, Santarém. Actualmente, parece que o que tem de significativo é um marco geodésico. Não encontrei qualquer outro elemento notável. Na história recente aparece por ter sido local da batalha de Almoster, em 1834, durante a guerra civil.
Se recuarmos mais alguns séculos, encontramos um Morgado com a designação do seu nome,  Mata Quatro. Era assim composto:
< Morgado de Mata Quatro, situado na freguesia de Almoster, Concelho de Santarém, …….., e compondo-se de cento e quarenta e uma propriedades, ….., compõe-se de quatro casais denominados Mata Quatro, Pereiro, Almodolim e Carvalhal situados na Ponte do Celeiro, freguesia de Santa Maria de Almoster, concelho de Santarém, e confrontam pelo norte com Paul Freixial, Poente com Real Mosteiro das freiras de Almoster, Sul com a quinta da Póvoa da Isenta, pertencente a Francisco José Araújo, e nascente até à Ponte do Celeiro com estrada publica e daí para cima com Paul de Almodolim e Mata Quatro, hoje pertencente a Francisco Hipólito Marrecos, o qual pega com o de Cláudio do Couto Silva, e acaba com o Paul do Freixial que é do Tenente Coronel Gorjão>.
<Em escritura de 1860 foi convencionado aforá-lo ao Excelentíssimo Visconde de Fornos de Algodres, pelo foro, clausulas e condições seguintes, na forma do Decreto de quatro de Abril de mil oitocentos trinta e dois, artigo 22….por três vidas.>.
Este vínculo foi estabelecido por Gil Vasques Leitão, que segundo Felgueiras Gaio, foi escudeiro, e vassalo dos Reis D. Fernando e D. João I instituiu um Morgado de certos casais em Almada e junto de Almoster por escritura feita pelo Tab.am Martim Gomes em 17 de Setembro de 1401.
O proprietário António Maria de Brito Pereira Pinto Guedes Pacheco vende-o em 1869 à empresa comercial Almeida Camacho Matos e Companhia em 1869. E mais notícia, não tenho.



quarta-feira, 22 de abril de 2015

Lápides na Ilha de Moçambique



Quando em 2013 visitei a Ilha de Moçambique lembrei-me de fotografar as lápides do cemitério, todas que pudesse e depois partilhar na internet, para que aqueles que lá deixaram família e amigos, os possam “visitar”. Além disso, as lápides, na falta de livro de registos, acabam por ser uma fonte de informação de dados biográficos.

O cemitério foi maltratado, pilhado e vandalizado. Nota-se agora algum cuidado, construíram o muro, fecharam o portão e têm um guarda. Há campas que foram construídas e outras em que alguém escreveu a tinta o nome do defunto. É triste ver as campas partidas e saqueadas, em alguns casos por razão nenhuma, pois não se percebe o que poderia haver ali para roubar. A capela do cemitério nada tem, nada, nem pintura nas paredes, muito menos ornamentos ou mobiliário. Aliás, não encontrei em nenhuma das Igrejas da Ilha que visitei uma única imagem, nem mesmo um altar.  E o que é feito do património cultural português que lá estava? Desapareceu, disseram-me, evaporou-se sem deixar registo, sem haver inventário e pelos vistos, sem criar interesse em saber dele.

Pela minha parte, tentei documentar o que encontrei, para servir aos que lá deixaram os deles.
As fotos podem ser vistas aqui:

http://fotos.sapo.pt/alexforjaz/fotos/?uid=hACLZcjeKLzvIMzZiMgI

terça-feira, 21 de abril de 2015

A quinta Filipa d'Água

(Capela em Murfácem/Caparica. Apenas para em falta de melhor, ilustrar o "post". foto do autor.)

Tenho vindo a aprender muito com as pesquisas que faço. Encontrei esta referência curiosa à quinta Filipa d'Água, que fica na outra banda, Almada, Monte de Caparica. Com o nome original, apenas existe uma rua e agora uma rotunda. Existem notas sobre uma Capela, mas não tive a sorte de encontrar fotografias. Quanto aos edifícios que em tempos faziam a quinta, não me foi possível identificar, a saber: 

<..... arrendada a João Leitão, casas de habitação, adega, oficinas, tudo abarracado, vinha, árvores de fruto e terras de semeadura, a partir pelo Nascente com a estrada publica, Poente com Dona Maria Tomásia, norte com Francisco Nunes, e Sul com João Leitão, avaliada livre que é, em três contos cento e cinquenta mil reis. > (documento de 1868)

O nome vem da sua instituidora, D. Filipa d'Água Leite Pereira, julgo que por volta de 1650. 

O testamento de Guedes Pereira, explica a origem: 
< Declaro mais que eu possuo uma quinta vinculada em morgado, instituída por João Gonçalves Castelo Branco e sua mulher Filipa d’Água Leite Pereira e meu pai com o dinheiro que havia dado para remissão da divida a que estava obrigada a dita quinta, à qual se anexaram algumas propriedades, a saber quinta grande de Alcaniça de que se pagam 40 réis de foro ao Convento da Rosa dos Paulistas  e outra vinha que comprei no mesmo sitio de que se pagam oitocentos réis ao Convento de São Vicente de Fora e outro … juntei mais à dita quinta um quintal que nela tinha Tristão Guedes de Queiroz <….> paga-se de foro 80.500 réis ou o que constar na assinatura do aforamento.  > Lisboa, ano de 1702

Os apelidos "Guedes de Queiroz", "Gonçalves Castelo Branco"e "Guedes Pereira " são recorrentes na outra bandaneste período e merecem uma "noticia" neste blogue. Entretanto, se alguém conseguir esclarecer o nome Alcamisas(?) que não consegui decifrar, ou acrescentar informação, agradeço.


terça-feira, 14 de abril de 2015

No dia do Regicídio


Se há acontecimento histórico recente que marca a História de Portugal, é o Regicídio. Não será por isso de estranhar o meu interesse em consultar os jornais do dia seguinte ao assassinato, os de dia 2 de Fevereiro de 1908.

O artigo faz o relato emocionado dos últimos minutos da vida d’El Rei e do Príncipe Real. Primeiro , um homem de barba negra, surge da multidão, saca da carabina escondida no sobretudo e dispara o traiçoeiro, pelas costas d’ El Rei atingindo-o mortalmente na nuca. D. Carlos tomba morto para os braços da Rainha D. Amélia. Não satisfeito, o torpe assassino, ou melhor dizendo assassinos, varejam com balas o Príncipe D. Luís Filipe, que caí atingido no pescoço e nuca. Em desassombro, a Rainha levanta-se para amparar o filho, logo se debruçando para ouvir os seus últimos murmúrios. Na carruagem atrás, D. Manuel era também emboscado, mas tem tempo para se defender. Assim, escapa quase ileso.
Depois de breves momentos de confusão, a população reage impedindo que os criminosos disparem sobre D. Amélia. As carruagens arrancam a trote. Para trás, os três assassinos são engolidos na multidão que os lincha.  

A notícia ocupava nem metade da primeira página. Pensei que se fosse hoje teríamos no mínimo ligação em directo com 24 horas de noticiário continuo. 
….
Prossegui na leitura do dito jornal curioso sobre os acontecimentos daquele dia. Uma notícia pequena, em caixa na segunda página, dava conta da morte de uma Sra. D. Gaudência Lobo da Silveira. Era esta senhora casada com D. Luís Lobo da Silveira, e para que não existissem dúvidas, entre parêntesis escreveram: Alvito.


Quem seria? Um e outro, pois não os tinha encontrado nunca. Procurei nos livros, não fosse falhar-me a memória, e nada. <Naturalmente houve algum engano da redacção> pensei. <Impostores não devem ser, pois em 1908 ainda vivia o Barão de Alvito, pelo que ninguém se atreveria a usurpar a filiação, isso dava direito a um enxovalho em praça pública. Se fosse um caso recente, da actualidade, nada me surpreendia, pois mesmo no outro dia encontrei uns de Beja que se dizem Alvitos e não são, nem pinga, tão pouco cêpa, sendo que a casta que têm é mesmo da uva, e as ilusões resultado da fermentação desta> concluí.

Meses mais tarde, quis o destino que tropeçasse novamente na Sra. D. Gaudência Lobo da Silveira. No processo do imposto sucessório fica esclarecido que é casada com D. Luís Lobo da Silveira, filho dos Barões de Alvito. A certidão de casamento confirma-o, e encontrei a certidão de nascimento. Não há dúvida, D. Henriqueta Policarpa Lobo da Silveira e D. António Luis de Sousa Coutinho, Marqueses e Barões de Alvito tiveram mais um filho, nascido em 1832, e por isso o mais novo dos rapazes. É o sétimo filho, dos oito conhecidos, a ver: 


D. Eugénia Lobo da Silveira * 10.12.1824


D. José Lobo da Silveira Quaresma, 4º marquês e 16º barão do Alvito * 11.03.1826


D. Fernando Estanislau José António Lobo da Silveira * 07.05.1827


D. Isabel Juliana Lobo da Silveira * 19.06.1828


D. Manuel Lobo da Silveira * 17.11.1829


D. António Clemente Lobo da Silveira * 23.11.1830


D. Luís Lobo da Silveira *1832


D. Margarida Lobo da Silveira * 1835


Não deixou descendência. Não deixou memória. E porque razão foi apagado?

Descobrir a existência de D. Luís Lobo da Silveira parece ser coisa pouca, ou não ter importância nenhuma. Mas quando se estuda uma família que teve a presença na História de Portugal que os Alvitos tiveram, e se observa que um dos seus, na última geração de titulares foi esquecido, abrem-se novas perspectivas para a investigação e para a compreensão da sua história.


Por mim, sinto-me um Botânico que encontrou uma nova espécie, este espécime que dá pelo nome de D. Luís Lobo da Silveira.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

O Mercador de Goa.



Na Sé Catedral de Goa, capela do Espírito Santo, está sepultado Manuel de Morais Supico, que faleceu em 1630. Terá sido um rico mercador, senão o mais rico da época, na viragem do século XVI para XVII, na Índia.

É possível encontrar algumas referências em publicações, a este rico mercador, tanto em Português como Inglês. Parece ser um personagem com interesse histórico, pois a sua vida é espelho das oportunidades que as rotas comerciais marítimas da Índia, Macau, Japão e Costa do Indico, ofereceram aos mais aventureiros.

Manuel de Morais Supico, apesar de representar o sucesso económico de alguns, e encerrar em si, quem sabe, muitas histórias de alianças e disputas que nos ajudariam a compreender a história de Portugal no Oriente, parece não ter sido investigado.

É certo que talvez sejam os portugueses quem mais curiosidade tenham, a respeito das rotas comerciais e vidas da época. É de esperar que venha de entre nós portugueses alguém que se debruce sobre este personagem mas, não só por curiosidade se “levantam os mortos”. Quando deixamos aos outros a narração da nossa História, pode bem ser que o enviesamento não nos seja de todo favorável. Como tal, talvez seja de bom juízo procurar informação e divulgar o nosso saber, para que conste que somos nós os guardiões da memória dos nossos avoengos.  

No que diz respeito à Índia e aos arquivos históricos do período Português, é uma pena não existir em Portugal uma cópia dos livros paroquiais, das conservatórias, da administração local e de tantos outros documentos de grande interesse para a nossa história. Talvez um dia seja possível um projecto de cooperação entre a Torre do Tombo e os Arquivos de Goa. Oxalá!

Partindo da informação possível e acessível, na Sé de Goa, na lápide da Capela do Espirito Santo, lê-se o epitáfio seguinte:

“Sepultura de Manoel de Moraes Capico / fidalgo da Casa de Sua/ Majestade Commendador da / Ordem de Christo e Senhor da / Villa de são Seriz e / de seus herdeiros.”

Na parede da Capela outra lápide revela:

“ Nesta capella está instituído um morgado com huma missa cotediana e outras condições declaradas no vinculo do dito morgado. Nella está sepultado Manuel de Moraes Capico seu primeiro Instituidor natural de Tralos Montes fidalgo da casa de Sua majestade Commendador do abito de Christo e Senhor da Villa se S. Seriz. Foi vreador nesta cidade de Goa. Falleceo sendo autualmente Provedor da Santa Misericordia em 17 de Maio de 1630. Pertence esta capela ao morgado e aos erdeiros do dito defunto.”

fonte: retirada da internet


Manuel de Morais Supico é transmontano, e poderá ser ou não natural de São Seriz, actualmente Sanceris, o que a sua lápide declara é que era senhor da Vila de São Seriz, por volta dos finais do século XVI. É possível encontrar estes apelidos em São Seriz, um tal Afonso Supico (Felgueiras e Gaio) é referido como Senhor desta Vila.

É este rico mercador que institui o Morgado de Seridão, Curca e Goa-Velha, composto de Palmares, várzeas, marinhas e terras. Este morgado, ou morgados são confirmados pelo facto de terem sido transmitidos de geração em geração até serem vendidos por volta de 1868.


A sua ascendência não está estabelecida. Quanto à descendência, há quem lhe atribua muitos filhos do seu casamento com D. Maria (ou Madalena) das Chagas, mas só é possível apresentar  como certos dois nomes:

Donato de Morais Supico (G-2), que casou com D. Luísa de Sousa f. de Fradique Lopes de Sousa, de quem teve D. Francisca de Morais mulher de D. Manuel Lobo da Silveira fº. do Conde de Serzedas . Donato de Morais Supico casou 2ª vez com D. Leonor Pereira f. de António Pereira de quem teve D. Margarida Pereira mulher de Jerónimo de Utra Corte Real fº. de Luís de Utra Corte Real s.g.

D. Paula de Morais Supico (G-2), que foi 2ª mulher de José Pinto Pereira Embaixador à Suécia pelo Rei D. João IV. Casou 2ª vez com Francisco Vaz Pinto Sr. da Casa do Bom Jardim ttº. de Pintos § 8 N 13 de que foi 2ª mulher. Casou 3ª vez com José Froes de Andrade fº. de António Froes de Andrade.

A linha de Donato desaparece, extingue-se na sua neta. Resta a linha de D. Paula Morais Supico. 

Do seu casamento com José Pinto Pereira, D. Paula de Morais Supico (G-2)  dá à luz António Luís Pinto Pereira (G-3) (há referências que apontam para que António Luís seja filho de Francisco Vaz Pinto, mas parece ser mais coerente a hipótese de ser filho do primeiro casamento pois tem exactamente os mesmos apelidos).

António Luis Pinto Pereira (G-3), proprietário do Morgado de Curca, India. Fidalgo da casa de Sua Majestade. Cavaleiro confesso do hábito de Cristo. Morador na Quinta das Conchas, Lumiar, casa com D. Madalena Josefa de Ataíde, de quem nasce:
Cosme Damião Pereira Pinto (G-4), a 15 de Outubro de 1691, que veio a ser Governador de Macau de 4 Agosto 1735 – 25 Agosto 1738 e de 25.08.1743 a 30.08.1747.
Cosme Damião tem um filho natural com D. Teresa Maria Micaela, de nome:
António Xavier Pereira Pinto (G-5), nascido a 4 de Novembro de 1733. Foi
Sargento Mor, proprietário dos Morgados de Goa-velha, Seridão e Curca. Morador na sua Quinta das Conchas, Lumiar, Lisboa. Casa com D. Antónia Joaquina de Portugal, de quem nasce a 19 de Novembro de 1772:
Antónia Leonor Pereira Pinto Guedes de Ataíde Portugal (G-6) que casa com António Maria de Brito Pegado Pacheco de Vilhena. Deste casamento tem vários filhos, sendo o primogénito e herdeiro João Brito Pereira Pinto Guedes Pacheco (G-7), nascido em 11.07.1796. Será nesta geração que o Morgado da Curca, Seridão, Goa-Velha é vendido por cerca de 54 contos de reis.